Pedro Sobral, presidente da Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL), antecipa à FNAC a primeira edição do encontro internacional Book 2.0, que decorrerá a 31 de agosto e 1 de setembro no Picadeiro Real, paredes meias com o Palácio de Belém, em Lisboa. Dois dias de debates e conversas, com convidados de várias áreas, para debater o futuro do livro, da leitura e da educação.  

Como surgiu a ideia deste encontro?  

Já há algum tempo que a APEL estava a tentar encontrar uma forma de criar um espaço de discussão pública, com todos os intervenientes do setor, à volta do futuro da edição e da educação. No ano passado, em conversas com o Presidente da República, o Professor Marcelo Rebelo de Sousa considerou que isto era um elemento absolutamente necessário para podermos começar a construir índices de leitura e de literacia mais aproximados aos da União Europeia, e sabendo da Festa do Livro em Belém, que o Presidente organiza em conjunto com a APEL, achámos que seria uma ideia feliz associar um ao outro. Isto é, tendo nós, a partir do dia 31 de agosto, a Festa do Livro em Belém, nos Jardins do Palácio -  uma Feira muito centrada nos escritores e escritoras portuguesas - achámos que podíamos ter previamente dois dias de conversa, de discussão e de debate.  

A quem se destina?  

Um dos primeiros objetivos era que este fosse um encontro que tivesse a presença de todos os intervenientes do setor, de escritores a escritoras, de executivos, de pensadores nacionais e internacionais, homens e mulheres, que estão de alguma forma, direta ou indiretamente, ligados aos grandes desafios que o setor enfrenta. Foi a partir de aí que começámos a construir um pouco este programa, que consideramos que está muito feliz.  

O setor enfrenta hoje mais desafios do que no passado, ou a dimensão dos desafios é agora maior? Como a Inteligência Artificial, por exemplo.  

Desde a invenção da rádio que se vaticinou a morte do livro. Depois foi a televisão, depois foi o cinema, depois foram as plataformas de streaming... O que é certo é que o livro continua aqui. Depois declarou-se o óbito do livro em papel, mas nunca se venderam tantos livros em papel como hoje — pelo menos no mundo ocidental, onde temos mais dados. Desde o final do século XIX até hoje, os desafios foram sempre muitos. O que é importante é a forma como olhamos para eles. Se os encararmos como uma ameaça, obviamente que temos muita dificuldade em navegar aquilo que se defronta, mas se olharmos para estes desafios como uma oportunidade, então provavelmente podemos continuar com o livro na base do desenvolvimento de uma sociedade.  

A Inteligência Artificial apresenta uma série de questões. A APEL e a Federação Europeia de Editores, onde estou também no comité executivo, têm trabalhado com a Comissão Europeia para perceber como é que podemos proteger os direitos dos autores, e de que forma. É uma conversa que está a ser tida, mas isso não significa virar as contas às enormes possibilidades que a IA pode trazer ao trabalho do dia-a-dia de um editor. Que pode ir de trabalhos muito invisíveis, como otimizações na área logística, até à tradução de um texto ou aos audiobooks. Já temos audiobooks feitos com essa tecnologia, mais centrados na mensagem do que na qualidade da leitura, com resultados muito meritórios, e que permitem, por exemplo, o acesso de pessoas com deficiência visual a uma série de obras que antes não estavam disponíveis.  

 

E qual o papel dos leitores no Book 2.0 Apel? 

 

Obviamente que os leitores têm de ter um papel fundamental. Como referia antes, o objetivo deste Book 2.0 é ter presentes todos os agentes do setor. Do escritor à escritora, do leitor à leitora. Aliás, vamos ter, em variadíssimos painéis, grandes leitores — como o Paulo Portas, o Anselmo Crespo, o Ministro da Educação e o da Cultura. E na audiência, idem. O evento está aberto a todos os que queiram estar presentes. Neste momento já temos muito poucos lugares, por isso quem quiser ir que se inscreva rapidamente.  

Qual o papel da leitura nos dias de hoje? 

Para nós, APEL, a leitura é essencialmente uma ferramenta crítica. A leitura não é apenas um hábito que nos preenche o tempo, que usamos para entretenimento ou para aumentar o nosso conhecimento. Também o é, mas, acima de tudo, a leitura é a ferramenta básica que nutre a nossa língua, que nos permite conhecer a nós mesmos e transmitir aos outros os nossos sentimentos. Além disso, e igualmente importante, é uma ferramenta que forma um espírito crítico perante a realidade. O que é especialmente importante num momento em que o mundo apresenta uma complexidade difícil de discernir, onde as fake news imperam, onde as teorias da conspiração tornam-se verdadeiras, onde os factos são confundidos com opiniões. Se nós não formos leitores, se não cedermos aos grandes livros, teremos uma enorme dificuldade em conseguir nutrir a nossa língua, de lutar e ginasticar a nossa imaginação e, perante isso, teremos mais dificuldade em perceber qual o nosso papel no mundo (...).

By FNAC CULTURA