Como
e quando começou a interessar-se pela Literatura?
O meu fascínio e prazer pela
leitura começou mais cedo que o meu interesse pela literatura. Lembro-me de
andar na 3.ª classe e ler maravilhado os contos infantis de Sophia de Mello
Breyner Andresen, de La Fontaine dos Irmãos Grimm ou mesmos os romances de
Júlio Verne ou L. Frank Baum. Ler foi sempre para mim tão fascinante como
embarcar numa aventura sem precisar de sair do lugar onde estava, que ganhou
mais importância quando fui para a Universidade até eu perfazer 28 anos – o
momento em que eu percebi que a escrita e a leitura passariam a fazer parte da
minha vida.
O
que despoletou o seu interesse pela Literatura?
O meu interesse pela literatura
derivou de um encontro com o Destino com uma jovem escritora, que hoje não só é
minha grande amiga como um grande poeta, chamada Sara F. Costa, no Verão de
2003 em São João da Madeira, que me emprestou para ler o livro de Poesia “Horto
de Incêndio” de Al Berto. No primeiro instante em que li o primeiro poema desse
extraordinário poemário, despertou em mim uma curiosidade desmesurada em ler e
pesquisar tudo acerca dos maiores clássicos da Literatura universal mais
antiga, e também, a mais contemporânea que, até hoje, não acabou.
Como nasceu a paixão pela
Escrita?
A escrita sempre me
fascinou desde o dia em que comecei a desenhar as primeiras letras e a procurar
os significados de alguns conceitos nos dicionários escolares que os meus pais
me ofereceram quando eu frequentava a escola primária (1.º Ciclo). Todavia, foi
só a partir dos 15 anos que arrisquei escrever os meus primeiros poemas, sem
ter qualquer tipo de experiência ou contacto mais direto com a Poesia. A paixão
prolongou-se durante os tempos da faculdade, mas foi só aos 28 anos que comecei
a entender a descrita mais como uma condição de vida e uma necessidade tão
importante para mim como respirar.
O
que mais o atrai quando escreve?
Desde muito novo que sou
viciado pelo absurdo, pela loucura e pelo mistério. Lembro-me de ler os livros
de Edgar Alan Poe e Agatha Christie e sentir um pequeno arrepio na espinha, da
mesma forma que sentia um fascínio e uma expectativa cada vez que lia os livros
de Saramago, Kafka, Gogol, Orwell ou Phillipp K.Dick. Tentar perceber, pela
leitura como o ser humano evolui e encara a vida a partir destes três elementos
é, para mim, a melhor forma de tentar compreender a condição humana.
Por
que motivo resolveu escrever livros?
José Saramago costumava dizer
que só escrevia livros quando tinha algo para dizer. Eu vou mais longe do que
ele e digo que só escrevo livros quando tenho algo para gritar. Dizer enquanto
fazer um mero relato que um dos nossos sentidos faz a respeito de um
determinado aspeto da vida humana é para mim insuficiente, comparado com a
quantidade de mistérios e perguntas que um grito acerca de quaisquer
circunstâncias, ou reação, capaz de provocar no subconsciente de um escritor
não só direito como o dever de escrever uma obra que seja o reflexo do
comentário que fez acerca desse grito que pretendeu ilustrar numa obra escrita
pelo seu próprio punho.
Qual
foi a obra que mais gostou de escrever e porquê?
Todas as obras que escrevi me
dão prazer de formas diferentes. Não há assim um livro que me desse mais prazer
do que o outro. O meu novo romance “A Fórmula do Peregrino” (Chiado Publishers,
2018), por exemplo, foi um deles. É, sem dúvida, um livro muito interessante do
qual gostei imenso de escrever. Foi um bocado morosa - e penosa – a sua
conclusão porque envolveu uma matéria sobre a qual não é a minha praia que é a
Ciência, mas que é muito importante porque aborda os motivos que provocaram a
guerra e, ao mesmo tempo, a aliança entre a Ciência e a Espiritualidade e até
onde pode levar o medo, o ódio, o preconceito e o fanatismo do ser humano.
Em
que é que se inspira para escrever um livro?
Toda a minha inspiração deriva
de um intenso estado de observação aguçada e holística que faço à realidade
cada vez que me encontro com ela num passeio espontâneo por uma localidade,
numa troca de palavras, num sussurro trazido pelo vento, numa notícia de um
jornal, numa canção, etc. Tudo aquilo que desperte em mim uma curiosidade
insaciável para levantar o véu das aparências do mundo e revelar algo que o
homem não está preparado para ver, ouvir e falar é alvo dessa inspiração que
leva a que escreva livros mais profundos e desassossegantes, seja de que género
ou tema for.
Em
que momentos do dia escreve habitualmente?
Normalmente, escrevo depois da
hora do almoço. É muito raro eu começar a escrever assim que acordo ou tomo a
primeira refeição do dia. Não sei bem porquê, mas a tarde funciona bem, para
mim, para a prosa, enquanto a noite funciona bem para mim para a Poesia. Talvez
o silêncio da noite tem algum efeito em mim que faça com que eu escreva mais
Poesia do que prosa. Não lhe sei dizer.
O
que desencadeia a escrita em si?
A escrita, para mim,
desencadeia um misto de sentimentos anacrónicos. Tanto sou capaz de manifestar
prazer e dor como expectativa e receio. Uma frase escrita por mim é sempre um
salto no desconhecido sem para-quedas, um mergulho num rio sem nome de águas
profundas numa noite cerrada onde, no fim, fico mais espantado e pensativo do
que enfadado e apático.
Quais
são as suas referências literárias?
Digo sempre, com muito
orgulho, que comecei a minha vida literária pela Poesia porque considero-a a
essência suprema da vida e de todas as Artes. E por isso assumo como primeiras
referências poetas que se transformaram em mestres da linguagem e do pensamento
e artífices da palavra como Herberto Helder, Tagore, António Ramos Rosa, Khalil
Gibran, Daniel Faria, Paul Celan, Cesariny, Fernando Pessoa ou Allen Ginsberg.
Todavia, no que toca à prosa, destaco escritores que conseguiram fazer dos seus
livros, exemplos de como se deve escrever e fazer dos livros literatura como
Umberto Eco, Clarice Lispector, José Saramago, Franz Kafka, Carlos Ruiz Zafón
ou José Luís Peixoto, apenas para citar alguns exemplos.
Como
vê o mundo atual da Literatura em Portugal?
Nos últimos 18 anos tenho
constatado no aparecimento de mais escritores cada vez mais jovens, sobretudo
mulheres, a ter cada vez mais destaque e êxito na literatura contemporânea
portuguesa e universal. Todavia, de todos aqueles que eu já li não encontrei um
que fosse capaz de romper com as linguagens e filosofias das gerações que os
antecederam – e como século passado – a ponto de inaugurar uma nova linguagem e
uma nova forma de abordar, filosoficamente falando, a realidade capaz de
inaugurar uma cultura virada para este século. Resta-me esperar.
Para
quando um novo projeto editorial?
Comecei a escrever em janeiro
o meu primeiro livro de contos, que espero vê-lo publicado no Outono e espero
concluir o meu novo livro de prosa poética – que ando a escrever desde 2012 –
antes do Verão deste ano.
Agora
que já conhece a revista “Livros & Leituras” que opinião tem deste projeto
editorial sem fins lucrativos?
Apesar de vivermos numa era em
que toda a informação é acessível à distância de um clique, existe muita Arte,
muitas ideias e muitas linguagens emergentes que deambulam pelo limbo da
indiferença de uma certa imprensa literária que parece ter parado no tempo e
começou só a falar dos autores famosos e consagrados e das suas obras e a ligar
pouca atenção ao que está ser feito de novo e inovador à margem da literatura
contemporânea, tal como a conhecemos e concebemos. E por isso, revistas
literárias, como a vossa, aparecerem em tempos de aparente indiferença, apatia
e indigência, como estes, são como uma gota de água no deserto do quotidiano para
todos aqueles que amam os livros, amam a literatura e continuam a acreditar na
Cultura, enquanto bem essencial para a vida e formação cívica de um indivíduo e
de um povo.
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